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China - Macau – CPLP


O Governo chinês estabeleceu em 2003, com sede em Macau, o Forum para a Cooperação Económica entre a China e os Países de Língua Portuguesa, também designado, abreviadamente, como Forum Macau.
Uma leitura rápida da Fig. 7, relativa a pegada ecológica versus biocapacidade, na China e nos países da CPLP para os quais há dados, permite verificar com facilidade o motivo do interesse chinês nos países de língua portuguesa: a vasta disponibilidade em recursos naturais. Acresce ainda que no cáIculo da biocapacidade não estão incluídos os recursos minerais (petróleo, ferro, aço ... ), mas somente os da capacidade regenerativa da biosfera (terra agrícola, pastagem, floresta e mar produtivo).
A China apercebeu-se facilmente que a CPLP era um antigo império à deriva, sem cabeça, que lhe estava a ser apresentado de bandeja, em Macau, com a devolução deste território em 1999.
A grande maioria dos territórios oficialmente falantes em português são ricos em recursos naturais e a antiga potência imperial - Portugal - não está preparada para esta nova era de uma complexa e exigente globalização. A China, por seu lado, tem tudo para ocupar, neste espaço territorial, o vazio deixado pela antiga potência europeia, agora cansada e desorientada: recursos humanos baratos, preparados tecnicamente e dinâmicos; elevada auto - estima; um território que estava associado ao antigo império (Macau); um mercado enorme, com poder de compra, ávido em bens minerais e alimentares; produtos de exportação com preços competitivos.
Era natural e legitimo que tentasse, com sucesso, ocupar um lugar privilegiado neste apetecido espaço, vastíssimo e que, apesar de disperso, devido a singularidade da anterior presença portuguesa, ainda mantém uma consistente rede de relações internas, nomeadamente através da língua, mas também necessariamente afectivas.
Por enquanto, parece que todos os parceiros estão a ganhar com o modelo estabelecido pelos chineses, sendo os números do sucesso do Forum Macau absolutamente avassaladores. Angola, no primeiro trimestre de 2008, voltou a ser o maior fornecedor de petróleo à China, ficando novamente à frente da Arábia Saudita. Este país lusófono é o principal parceiro comercial do gigante asiático em África, assim como, para Angola, a China representa o principal mercado das suas exportações. O Brasil, em 2007, exportou para a China 3,8 mil milhões de dólares de soja, o equivalente a um terço da sua produção total. Também fornece o ávido cliente oriental em minério de ferro, ocupando o terceiro lugar nos abastecimentos ao primeiro comprador mundial desta matéria-prima. Este gigante da lusofonia já tem na China o seu terceiro parceiro comercial e representa para ela o primeiro na América Latina.
Dum modo geral, o comércio entre a China e os países lusófonos cresceu 36% em 2007, para 46 mil milhões de dólares, tendo mais que triplicado entre 2003 e 2006. O Brasil, apesar do significado das exportações de petróleo de Angola, ocupa o lugar principal, com uma troca comercial de 23 mil milhões de dólares em 2007, verificando-se nesta um crescimento de 43 % em relação a 2006.
A Índia, tal como a China tem Macau, possui Goa, Damão e Diu, territórios que aliás apresentam uma marca portuguesa bem mais vincada. No entanto, não a vemos avançar com iniciativas do mesmo cariz da chinesa, com o seu Forum Macau. Dever-se-á a Índia não ter historicamente uma natureza imperial, centralizada, como o seu concorrente asiático?
Valeu a pena ...
Na realidade, nenhum país, incluindo Portugal, ganharia em se opor à insistência chinesa em entrar no clube lusófono. Não podendo, como é óbvio, entrar na CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), a China, por iniciativa do próprio Governo Central, cria o Forum Macau e apresenta-se internacionalmente como o maior defensor externo da CPLP, ao ponto de ter financiado a cimeira comemorativa do 10° aniversário desta, em 2006 na Guiné - Bissau, com a oferta de 800 mil dólares ao governo deste país. Contudo, entre uma oposição quixotesca e uma falta total de estratégia por parte de Portugal, há um meio-termo que urge saber e conseguir construir.
Sejamos claros: se a China tem direito a ter uma estratégia declarada, Portugal não o tem menos. A Grã - Bretanha também devolveu Hong Kong a China (a qual com todo o direito o exigiu) e não foi por este território ter estado ligado ao anterior Império Britânico que a Commonwealth passou a ser coordenada por Pequim, como quase esta a acontecer com o anterior Império Português (de boa ou ma memoria, mas certamente não de pior memoria que o britânico). O que se passa é que os portugueses que actualmente ocupam o território europeu desta histórica nação, não possuem a menor estratégia, consistente, quanta ao momento presente e futuro. Parece que o seu principal desígnio é entregar e vender tudo a estrangeiros, ficando muito orgulhosos com essas negociatas, como um herdeiro incapaz que não sabe concretizar mais do que vender o património que os seus antepassados arduamente acumularam, durante gerações, gastando depois sem outro objectivo que não seja o mero consumo.
É certo que a um povo que não sabe sequer defender a sua margem esquerda do Guadiana e vai paulatinamente entregando as suas melhores terras agrícolas ao vizinho espanhol, que assim finalmente prolonga a sua fronteira sem disparar um tiro mais umas largas dezenas de quilómetros para Oeste, desculpando-se desonesta ou estupidamente que estamos a viver a era da "globalização", não se lhe pode pedir que consiga ter uma visão e vontade estratégica mínimas para o vasto espaço humano e territorial, espalhado por todo o globo, construído pelos seus antepassados. Mas, sinceramente, não deixa de ser profundamente triste ...
Este projecto do Forum Macau até pode ser uma oportunidade para Portugal. Mas é preciso que ele, pelo menos, saiba ser o protagonista dominante do seu derradeiro património: a língua portuguesa. Com efeito, a China está a ter a sabedoria e a delicadeza de querer falar em português com os habitantes dos países membros da CPLP, estando a fazer um enorme esforço de aprendizagem da nossa língua. Contudo, não são maioritariamente portugueses que estão a ensinar a nossa língua na China, mas sim outros que, aprendendo a língua, lhes vão ensinar. Os portugueses, "europeus", parece que desde 1986 (ano da desejada e necessária adesão a ex - CEE) se especializaram somente em lidar com subsídios. Os chineses apelidam os portugueses actuais de "pedintes de arroz".
Por outro lado, como português que me orgulho de ser, quando viajo pela China e observo uma crescente referência a Macau e sei das justificáveis intenções chinesas para este vasto território planetário oficialmente de língua portuguesa, vou construindo um sentimento de compensação de que, ao menos, estas relações estão a ser construídas falando-se em português e não em inglês.
Com efeito, os chineses, ao comunicarem com os lusófonos em português e não em inglês, como sucede com os cidadãos da superpotência em declínio, os norte - americanos, até porque esta é a língua de um outro império seu concorrente e, na verdade, nunca ninguém os entenderia em chinês, confirmam a posição determinante da língua portuguesa (a mais falada a suI do Equador) nas relações internacionais deste século.
É no mínimo curioso, e extremamente gratificante para qualquer português que ainda possua alguma réstia de dignidade, constatar que o mesmo poder político de um país que poucos anos antes, 1999, recuperava a legitima administração de um seu território (Macau), aproveitando para propaganda doméstica a mensagem de expulsão do "invasor colonialista", passados escassos quatro anos, formalizava em 2003, nesse mesmo território e com toda a solenidade e dinamismo, um Forum que constitui a principal confirmação e reconhecimento externo da existência de uma comunidade entre pessoas que falam português. Isso, quer queiram quer não, porque antes, os agora países de que são cidadãos esses lusófonos, estavam intimamente ligados, num mesmo pais (Portugal global), ao tal "invasor colonialista" (Portugal europeu).
Afinal, valeu a pena ... Mesmo que os ocupantes do espaço europeu da comunidade que fala português não saibam posicionar-se dignamente no mundo, ou não revelarem uma capacidade minimamente a altura da sua História, o património, sobretudo humano e cultural, que os seus antepassados construíram pelo globo, e tão rico e profunda que, felizmente, já deles não depende para a sua sobrevivência como uma unidade, reconhecida por terceiros. E "Portugal" a perpetuar-se, como singular projecto universalista e intercultural, absolutamente necessário para os desafios da humanidade neste século, serenamente, sem já precisar de Portugal.
China, o cliente, Portugal, o fornecedor
Angola, na actualidade, representa um excelente exemplo da oportunidade que Portugal sabe desenvolver, quando pretende e para tal trabalha. Apesar de a China ter neste país um papel crescente, Portugal consegue ser o principal fornecedor de Angola, com 17% das importações em 2006, totalizando 1.100 milhões de USD, enquanto a China se posiciona somente em quarto lugar, com 8,5% das importações.
Como é óbvio, o gigante do Extremo Oriente, ávido em matérias - primas e alimentos, vemos países lusófonos uma estratégica fonte de abastecimentos, decisiva para a manutenção do seu ritmo de crescimento económico, e não propriamente um mercado que justifique o empenho que estão a manifestar no Forum Macau. Exceptuando o Brasil, com os seus 190 milhões de habitantes, os restantes países lusófonos, apesar de requererem infra-estruturas e bens que a China pode fornecer em condições concorrenciais, não justificam que esta pretenda dominar por completo as relações comerciais com eles, sendo simultaneamente o principal cliente e fornecedor. Os obstáculos diplomáticos que tal poderia acarretar, inclusive no âmbito do Forum Macau, colocariam eventualmente dificuldades ao seu principal objectivo: o abastecimento.
Deste modo, a China, sendo o principal cliente para o petróleo angolano, está a financiar as crescentes vendas portuguesas para este país lusófono, dado que o PIB angolano baseia - se em 57 % na exportação de petróleo. O aumento do preço do petróleo, estimulado em parte pela procura chinesa, pode favorecer indirectamente alguns sectores da economia portuguesa ao ser previsível a continuação do aumento das nossas exportações para Angola.
Com efeito, Portugal é um pequeno país no qual facilmente pode exercer um significativo contributo económico a sua eventual capacidade em se integrar nas dinâmicas criadas pela gigantesca procura de matérias - primas e alimentos, nos países africanos lusófonos, por parte do já quase principal motor da economia mundial.
Temos que ter a consciência plena que o mundo mudou! A China será, neste século e talvez nos seguintes, a principal potência económica do planeta, por direito próprio (efectivo populacional e capacidades endógenas). No entanto, não possui recursos naturais, tal como o Japão, para manter a seus níveis de consumo. Possivelmente a região do mundo onde os irá continuar a encontrar em maior abundância e facilidade de obtenção será nos países lusófonos, exceptuando Portugal evidentemente.
Portanto, é fundamental estarmos cientes que a presença chinesa nos PALOP não é ocasional, mas sim cada vez mais estrutural. Por isso, deveríamos conhecê - Ios o melhor possível e saber como estabelecer parcerias e delas beneficiar, ao invés de pensarmos que os poderemos evitar. Quanto mais adiarmos este inevitável processo, menos os conheceremos e influenciaremos, mais eles irão penetrando no espaço lusófono sem a envolvência portuguesa, porque os outros membros da CPLP continuarão obviamente a abrir - Ihes as portas, dado 0 peso do seu mercado e outras vantagens de que são detentores.
Por outro lado, Portugal sem os países lusófonos esvai-se enquanto país independente, no contexto da UE, e com poder económico mínima para os seus habitantes originais (os portugueses) continuarem a deter a posse dos bens - empresas e propriedades - aqui existentes, nomeadamente perante a paulatina e metódica conquista espanhola. Somos todos empurrados para o oceano! Como já deveríamos ter verificado, os espanhois vão demonstrar-nos que este territ6rio, onde no último milénio havia um Estado soberano e influente no mundo, denominado "Portugal", não vai precisar para quase nada do que resta dos seus habitantes indígenas, apesar de afáveis e acolhedores.
Portanto, se queremos continuar a ter uma morada aqui na Europa, com o mínimo de dignidade, temos que nos por ao caminho, como sempre sucedeu na nossa Hist6ria. Esse caminho, na nova ordem mundial, vai cruzar-se para além dos nossos antigos parceiros do anterior "Portugal global" que todos viveram, com a recém - chegada nova potência global, do Extremo Oriente, quer queiramos quer não.
A China vai continuar necessariamente a ser o grande mercado que, no âmbito dos P ALOP e Brasil, viabilizara determinadas produções, nomeadamente algumas agrícolas: soja e algodão, por exemplo.
Portugal possui um potencial estratégico enorme para a sua participação qualificada nesta nova CPLP que se está a construir. O Instituto de Investigação Cientifica Tropical e detentor de um invejável património conhecimento sobre de a realidade deste espaço, como nenhum outro país conseguia. Nas nossas Universidades ainda há muitos quadros que são oriundos destes recém - criados países. Tudo isto proporciona, para além obviamente da língua, uma invejável vantagem para fornecermos investigação, formação e consultadoria de qualidade.
Neste âmbito, convinha que não fossemos míopes ao ponto de não se criar uma ampla oportunidade para quadros dos PALOP, mas também do Brasil, realizarem estudos universitários em Portugal, nomeadamente ao nível da pós-graduação, e de preferência com programas adaptados as suas realidades, tal como muitos países da UE tem vindo sabiamente a concretizar para as suas áreas de influência. Sem redes de contactos, cimentados num relacionamento humano, tudo se esvairá.
De certeza que Portugal será ainda o país que maior empatia terá com os novos países lusófonos, havendo um cuidado especial em realizar obra de que se orgulhe e não somente em obter uns benefícios económicos duma oportunidade fugaz aproveitada com esperteza. Nesse âmbito, é de ter esperança que, em conjunto com os quadros destes países africanos e de acordo com a vontade destes, os portugueses contribuam para o estabelecimento de projectos - modelo, nomeadamente quanta a sua sustentabilidade ambiental, mas também económica e social.
Eu acredito vivamente que seremos capazes, se assim o quisermos.